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É chegado o momento em que os blocos de todos os tipos tomam as ruas e avenidas das cidades brasileiras transformando radicalmente a paisagem urbana. Em São Paulo, os foliões que consolidaram o gosto pela festa estão se deparando com um elemento estético há um tempo esquecido, mas que retornou como forte tendência da moda: o gradil.
Aos poucos, o gradil foi entrando na festa, tornando-a mais próxima da experiência dos megafestivais de música do que do Carnaval de rua livre, que retornou à cidade, e a apaixonou, dez anos atrás —data de início de sua política pública. Para garantir a exclusividade das grandes marcas que bancam a conta da festa, nosso Carnaval fica a cada ano mais refém do confinamento. Tudo em nome da segurança e do controle. O gradil é o estandarte dessa lógica de gestão carnavalesca. O símbolo mais que concreto do retorno coletivo para o camarote. O abre-alas para o fantasma histórico do confinamento.
Na disputa pelo modelo urbano do Carnaval, blocos e poder público estão em lados opostos. A Prefeitura de São Paulo promete uma festa “eficiente”, ou seja, rua limpa, carro andando normalmente, o mínimo de “desordem” possível. Enquanto os blocos ficam espremidos entre o gradil, a falta de diálogo e a falta de financiamento. Tudo com hora para acabar: 18h, carnaval matinê.
Para sair da lógica de camarote a céu aberto a que estamos nos encaminhando, o Carnaval de rua de São Paulo precisa repactuar o óbvio. Reafirmar a evidência que a prefeitura insiste em negar: o protagonismo do Carnaval de rua é dos blocos. Sem eles, não há festa. Retirar o Carnaval de rua —essa expressão eminentemente cultural— da gestão da Secretaria Municipal de Cultura, nesse sentido, mais do que um desvirtuamento de gestão, é um negacionismo programático. É condenar a política à falência por retirar dela a compreensão do que é efetivamente fazer Carnaval. Desvia-se o olhar da dinâmica cultural de onde ele brota: a dinâmica dos blocos.
Bloco de Carnaval é uma tecnologia social sofisticada, cultural e complexa. É ancestral e mutante ao mesmo tempo, como podemos ver na coexistência de grupos como o tradicional bloco afro Ilú Obá de Min e o Minhoqueens, o bloco drag-dj, referência LGBTQIAP+.
É uma tecnologia social que cultiva em seu próprio território suas práticas e saberes. Não aceita colonialismos carnavalesco. Nada mais anticarnavalesco do que ditar ao outro o que é Carnaval.
Essa tecnologia social carnavalesca é construída na diversidade de territórios, povos e tempos históricos. A instituição bloco de Carnaval, legitimamente brasileira, é uma grande contribuição para os carnavais mundo afora, como arranjo estético, organizacional e financeiro. Uma organização socioafetiva de festa, com um objetivo comum: a folia como caminho para a felicidade. Isso em todos os lugares que se instala, nas diversas épocas da história, pelas muitas mãos de quem o faz hoje, o fez ontem e o fará amanhã.
Acontece que o que vemos hoje, não só em São Paulo, mas nas diversas cidades carnavalescas do Brasil, é a apropriação dessa tecnologia social pelo grande capital. Uma proliferação de ações de marketing casadas com nomes de artistas já consagrados fazendo um cachê, drenando recurso público destinado a festa de rua, usurpando a paisagem urbana e surfando numa política cultural que precisa urgentemente de regulação e atualização. Todos recebendo o nome, neste caso inapropriado, de bloco de Carnaval.
Ao sair de casa para se jogar no fervo, o folião precisa se perguntar não somente “para qual bloco eu vou?”, mas “para onde eu vou é, de fato, um bloco?”. Camarote é démodé demais.
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