Medo do cancelamento virtual é um gatilho real, explicam as psicólogas, Alice Munguba e Daniela Araújo
Postado em: 02-02-2024 às 10h00
Por: Letícia Renata Leite da Silva
O aumento do uso das redes sociais desempenha um papel fundamental na amplificação da cultura do cancelamento. Que consiste em uma prática de organizar um boicote generalizado contra uma pessoa, geralmente uma figura pública, devido a comportamentos ou declarações ofensivas, injustificadas ou moralmente condenáveis.
Com a velocidade e o impacto da informação online, é possível desencadear uma onda de indignação em minutos. Embora essa cultura possa ser vista como uma forma de responsabilização, também pode ter consequências preocupantes. Os cancelamentos públicos podem causar graves danos psicológicos, isolamento social e impactos na saúde mental dos envolvidos.
A Meta, que controla o Facebook e o Instagram, iniciou em 2024 anunciando mudanças nas diretrizes de proteção a adolescentes em seus apps. Conforme a big tech, determinados conteúdos sensíveis serão ocultados de acordo com idade do usuário, entre outros recursos que visam minimizar o impacto das redes sociais na saúde mental dos jovens. Para a psicóloga Alice Munguba, a medida é muito importante porque a adolescência é um período de formação em que os limites entre o real e o virtual se confundem.
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“A adolescência é uma fase em que há uma valorização muito maior do outro, o grupo de amigos passa a ter uma importância enorme. Muitas vezes, os adultos esquecem de que nesta etapa de formação da personalidade, a opinião das outras pessoas têm uma influência subjetiva muito grande, assim como aquilo que se lê, que se assiste, e aqui entra os conteúdos online sobre automutilação, distúrbios alimentares, entre outros assuntos que serão restringidos pelas redes sociais”, detalha a profissional.
Cancelamento e ansiedade social
Para a psicóloga, é importante que empresas de tecnologia reconheçam que, apesar do controle sobre uso das redes sociais ser uma responsabilidade dos pais, elas também têm que se responsabilizar e limitar o conteúdo sensível que veiculado e propagado virtualmente, mesmo que se saiba que existam outras questões – como o cyberbullying e o cancelamento – que implicam outros cuidados, às vezes até mesmo do ponto de vista legal ou de saúde.
Para a Daniela Araújo, psicóloga, cada vez mais crianças e adolescentes chegam aos consultórios com episódios de sofrimento emocional ligados ao desequilíbrio entre o mundo real e o virtual. “Os profissionais de saúde mental estão recolhendo algumas consequências e acredito que este é o futuro. Percebemos que os jovens chegam infectados pelo mundo imaginário das redes sociais e despreparados para a realidade das relações humanas, que é a diferença, a dificuldade de conviver”, destaca.
Com essa predominância das relações online, inclusive nas expectativas sobre o futuro, já que muitos adolescentes sonham em viralizar, em se tornarem influenciadores digitais, somada com a vulnerabilidade que a adolescência representa, já que é a etapa de construção da personalidade, perder a aprovação online, ou seja, ser cancelado nas redes, se torna um gatilho real e pode desencadear transtornos mentais, inclusive.
A participação de Vanessa Lopes no BBB
A influenciadora Vanessa Lopes surpreendeu os participantes do Big Brother Brasil 24 ao desistir do jogo logo nas primeiras semanas de confinamento. A saúde mental da participante já vinha despertando a atenção dos colegas de programa e do público por apresentar comportamentos um pouco perdidos. Ao sair do programa, a jovem está recebendo tratamento psiquiátrico em casa, de acordo com boletim médico publicado pela família.
“A participação de Vanessa Lopes é um tema delicado porque não podemos diagnosticar ou falar sem acompanhar o caso, mas podemos hipotetizar sobre a diferença entre o mundo real e o mundo virtual. Não que esse seja o caso dela, mas essa diferença entre o virtual e o real pode abalar algumas pessoas e desencadear situações de sofrimento mental. Não é à toa que muitos jovens estão desistindo dos estudos porque conviver coletivamente se tornou fonte de uma ansiedade incapacitante”, aponta Daniela.
Para as psicólogas, os efeitos da alta exposição e presença no ambiente virtual cada vez mais mostrará suas potencialidades e suas consequências nocivas, basta analisar que as telas entram cada vez mais cedo na vida das crianças, que desde muito pequenas já estão com o smartphones na mão. O ideal para os responsáveis é sempre buscar o equilíbrio entre os jogos online e as brincadeiras com a turma presencialmente.