Nas palavras de Andreas Pereira, o resumo de um importante debate sobre a seleção brasileira: “Nosso meio de campo é muito bom, todos os jogadores jogam na Premier [League]. É qualificado. Se a gente pegar nome por nome, a gente tem uma seleção que eles sonhariam em ter no Uruguai”. Ele está absolutamente certo, porque não há nada neste raciocínio que não corresponda à realidade. Andreas também está errado, porque a frase faz parte de sua resposta a um questionamento – feito oportunamente por Luis Roberto, narrador da TV Globo – sobre os diferentes estágios de construção de equipe ocupados pelas seleções brasileira e uruguaia, adversários deste sábado (6) por uma vaga nas semifinais da Copa América.
Foi necessário um segundo tempo de muito, mas muito sofrimento, para que a diferença entre Brasil e Colômbia, sob o aspecto do funcionamento coletivo, ficasse exposta no gramado em São Francisco, na terça-feira passada. Utilizando os mecanismos de jogo aplicados por um trabalho estabelecido pelo tempo, os colombianos elevaram o nível de exigência técnica e física a tal ponto que a seleção brasileira teve extrema dificuldade para conservar a bola. Neste cenário, o meio de campo formado por Jhon Arias, Richard Ríos e James Rodríguez, todos participantes da Série A do Campeonato Brasileiro (James, como se sabe, apenas formalmente), dominou o setor em que atuaram Bruno Guimarães, João Gomes e Lucas Paquetá, jogadores da Premier League inglesa.
Reconhecer o que se deu em campo não significa dizer que o trio colombiano supera o brasileiro. Com efeito, não o faz. Individualmente, também não. Ocorre que, num plano coletivo em que a Colômbia opera melhor, Arias, Ríos e James foram capazes de executar papéis que colaboraram de maneira decisiva para esse desequilíbrio. É por causa desse tipo de dinâmica que boas equipes não são formadas meramente pela reunião de futebolistas de alto nível. É preciso que trabalhem bem juntos, que se complementem, que interajam da forma mais eficiente e produtiva para o conjunto, sob um modelo que considere suas qualidades. Na sétima partida com Dorival Júnior, seria anormal que a seleção brasileira atuasse num nível próximo do seu potencial máximo, mesmo levando em conta o pedigree de cada jogador.
Da Colômbia ao Uruguai, este aspecto da conversa não muda. Marcelo Bielsa conduz seu time por uma estrada mais longa na formação de um jeito de jogar, com o lastro e a rodagem que o Brasil de Dorival ainda procura. A vitória no último encontro, pelas Eliminatórias Sul-Americanas, contra a seleção dirigida por Fernando Diniz, foi um resultado tão natural quanto educativo neste sentido. Como disse Andreas, o Uruguai realmente sonharia em ter os nomes que compõem o time brasileiro, mas é muito improvável que Bielsa queira trocar o desempenho coletivo de seu time pelo que viu até agora do Brasil. Esse era o assunto da pergunta apresentada a Andreas, as diferenças de estágio na montagem de equipes, um conceito que boa parte da opinião pública brasileira que se interessa por futebol prefere dispensar.
O encontro deste sábado é muito difícil para o Uruguai, porque o talento ofensivo à disposição da seleção brasileira exige uma atuação praticamente sem erros. O trabalho de Bielsa – que não deixará de ser bem executado por falta de estudo – será tornar o jogo desconfortável para o Brasil, muito provavelmente com práticas semelhantes ao plano defensivo colombiano, respeitadas as diferenças entre as formas de marcar de cada equipe. A propósito: o meio de campo ideal do Uruguai tem um jogador do Real Madrid (Valverde), um do Paris Saint-Germain (Ugarte) e um do Flamengo (De la Cruz). Para que eles atuem, ficam no banco um jogador do Tottenham (Bentancur) e o mais talentoso meio-campista do futebol brasileiro, Arrascaeta.