DIEGO GUICHARD
NAZARÉ, PORTUGAL (FOLHAPRESS) – A maior onda já surfada na história pode mudar de dono. Na última sexta-feira (19), o guarujaense Rodrigo Augusto do Espírito Santo, conhecido como Rodrigo Koxa, 46, surfou um paredão próximo aos 30 metros de altura na Praia do Norte, em Nazaré, em Portugal, e tem chance de retornar ao topo do Guinness World Records. Entre as mulheres, a carioca Michelle de Boullions acredita ter batido o recorde feminino durante a realização do WSL Big Wave Surfing 2024/25, também neste mês.
As primeiras medições (extraoficiais) para a onda do paulista apontam para uma altura de 29,15 m -algo como um prédio de 10 andares-, superior ao registrado pelo alemão Sebastian Steudtner. Em 29 de outubro de 2020, o europeu bateu o recorde anterior (do próprio Koxa) ao deslizar por um pico de 26,21 m.
Em contato com a Folha de S.Paulo, Koxa disse ter surfado a “onda da vida”, não só pelo tamanho, mas pela formação triangular do fenômeno proporcionado pela força descomunal do Canhão de Nazaré. “Surfei ela no pico, desci no meu limite e tive vontade de abortar por várias vezes. Foi a onda da minha vida, com grau de comprometimento maior de todas. Essa é a onda mais perigosa do mundo, que arranca um braço do corpo se pega mal”, conta. “Quando eu entrei no tubo, parecia uma máquina do tempo me sugando. Cabia um ônibus dentro dela”.
Koxa chegou a temer pela própria saúde, devido à proximidade com as pedras e com a velocidade que estava na água, em torno dos 80 km/h, segundo ele. Mas conseguiu sair ileso. “Essa onda foi realmente especial. Muito mais rápida do que as ondas padrão de Nazaré. Agradeço demais a puxada do meu parceiro Vitor Faria, porque me colocou no lugar perfeito. Do contrário seria impossível ter surfado com sucesso”, explica.
Com essa manobra, o brasileiro desponta como favorito para conquistar o prêmio anual de ondas gigantes, o “Big Wave Challenge”, competição que deve ser anunciada por volta de abril, após a temporada de ondas gigantes em Portugal. Se a medição for superior aos 26,21 metros, o recorde deverá ser homologado pelo Guinness.
A medição atual foi feita por Paulo Vinicius Lopes, designer, cineasta e surfista. Foi ele o primeiro a analisar a onda de Koxa em 2017, quando o paulista entrou para o Livro dos Recordes.
“Nós não temos certeza que vai quebrar o recorde. Mas é a tendência se for medida corretamente. Para medir eu pego o tamanho da canela do surfista, analiso onde é a base e o topo da onda e multiplico. Depois, preparo um material e mando para todo mundo. Foi assim em 2017, quando enviamos para a WSL”, relata.
MICHELLE DE BOULLIONS PODE QUEBRAR RECORDE DE MAYA
O designer também acredita que Michelle de Boullions tenha alcançado o recorde de Maya Gabeira, de 22,4 metros em 2020. Durante a realização do WSL, a carioca se deparou com uma onda monstruosa, logo na primeira bateria do dia.
“Não foi só o mais gigante, mas o mais perfeito dos últimos tempos. Essa perfeição toda me deixou mais empolgada ainda. Eu acho que sim (quebrou o recorde), tem tudo ao meu favor, foi muito grande mesmo”, relata Michelle à Folha de S.Paulo.
Na mesma competição, a britânica Laura Crane também pegou uma onda com potencial para entrar na lista das maiores ondas surfadas. A competidora espera pelas medições oficiais.
Os critérios de medição geram debates no universo do surf. A principal referência é o corpo do próprio surfista, em comparação com o tamanho da ondulação, com base em imagens e vídeos. O movimento do atleta também é considerado, o percurso realizado, o tempo de duração e se ele realmente pegou a onda inteira.
A Liga Mundial de Surfe (WSL) transferiu a responsabilidade pelas medições para o norte-americano Bill Sharp, do Big Wave Challenge, e para a equipe do Guinness World Records. Sharp já admitiu que essas ondas recentes serão analisadas.
O Canhão de Nazaré é uma ravina submarina de grandes proporções, com cerca de 230 quilômetros de extensão e profundidade que pode ultrapassar 5.000 metros. Formado por movimentos tectônicos e processos de erosão ao longo de milhares de anos, ele intensifica as ondas do Atlântico à medida que elas se aproximam da costa, provocando um aumento repentino de sua altura, força e velocidade.
É esse fenômeno que proporciona ondas descomunais, como as que Michelle e Koxa surfaram. Devido a um mar tão perigoso, a prática de surfar ondas gigantes em Nazaré só é possível graças ao chamado “tow-in surfing”, quando um atleta é impulsionado por outro por um jet ski. Além disso, geralmente há um outro veículo marinho de prontidão para realizar eventuais resgates, enquanto um “spotter” orienta o grupo por rádio com olhar de fora da água.
Com cerca de 15 mil habitantes, Nazaré se transformou graças ao turismo de surfe e continua em rápido crescimento. A cidade ganhou notoriedade a partir de 2011, quando o surfista havaiano Garrett McNamara surfou uma onda colossal de 23,8 metros, estabelecendo um recorde para a época, e provou que era possível domar essas paredes gigantes.
Desde então, Nazaré se reinventou, cresceu a partir do chamado turismo de surfe -algo que cidades brasileiras, como Jaguaruna, em Santa Catarina, tentam se inspirar. A cidade portuguesa, no entanto, se mostra incomparável para a prática de ondas gigantes, onde surfistas chegam a aguardar até um ano inteiro pela formação das condições ideais.






