Sem a MP, que iria cobrar impostos de ricos, fintechs e bets, governo prevê corte de R$ 7,1 bilhões nas emendas parlamentares para manter equilíbrio do Orçamento de 2026
BRASÍLIA, DF (FOLHAPRESS) – As emendas parlamentares terão um corte de R$ 7,1 bilhões no Orçamento de 2026 se o Congresso Nacional não compensar o espaço fiscal perdido com a derrubada da MP (medida provisória) de aumento dos impostos, segundo cálculo de técnicos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Na situação atual, o valor não poderá nem sequer ser incluído no Orçamento, para preservar a fatia das demais despesas discricionárias (que incluem custeio da máquina pública e investimentos) no gasto total, como prevê o acordo firmado no STF (Supremo Tribunal Federal).
Se o Legislativo insistir num montante maior de emendas, Lula poderá vetar o excedente, segundo esses técnicos.
Essa é uma medida mais drástica do que um mero congelamento, quando os recursos podem ser liberados no futuro, caso haja melhora das condições financeiras do governo. O corte significa que as ações carimbadas pelos congressistas nem estarão previstas na peça orçamentária a ser aprovada até o fim de 2025 e cuja execução se dará em ano eleitoral.
A previsão atual é que as emendas alcancem até R$ 52,9 bilhões no ano que vem, dos quais R$ 40,8 bilhões são obrigatórias (individuais e de bancada) e R$ 12,1 bilhões de comissão. O entendimento do governo é de que o corte reduziria o espaço para indicação dos parlamentares a R$ 45,8 bilhões.
As emendas ainda poderão sofrer um contingenciamento adicional de R$ 4,5 bilhões em março, quando o governo fará a primeira revisão de receitas e despesas de 2026, caso até lá os parlamentares não aprovem o projeto de lei complementar que autoriza um corte nos benefícios tributários. Essa trava, porém, poderia ser revertida com mais facilidade até o fim do exercício se houver recomposição da arrecadação com outras medidas.
O alerta sobre as emendas tem sido um dos instrumentos de pressão do Executivo sobre o Congresso, numa tentativa de abrir caminho à retomada de parte das medidas da MP ainda este ano. Parlamentares criticam o que veem como uma chantagem do governo, mas técnicos afirmam que é uma questão matemática a partir do acordo sobre as emendas mediado pelo STF.
Sem a MP dos impostos, que também previa medidas de redução de despesas obrigatórias, o ritmo de crescimento das emendas poderia achatar as demais despesas discricionárias, parcela do Orçamento usada para pagar contratos de manutenção, limpeza, compra de materiais e pagamento de obras e investimentos.
Para chegar a essa conclusão, os técnicos do governo levaram em consideração alguns fatores.
O primeiro deles é o fato de que, sem as receitas da MP, o governo não poderia orçar a despesa no exato limite do arcabouço fiscal. O gasto previsto no Orçamento seria menor, na mesma medida da arrecadação perdida (R$ 20,9 bilhões), e o corte recairia sobre as discricionárias.
O segundo fator é a impossibilidade de usar o espaço adicional de cerca de R$ 12 bilhões garantido pela nova PEC (proposta de emenda à Constituição) dos precatórios, que incorporou na base de cálculo do limite de 2026 um valor extra de despesas deste ano.
O terceiro fator é a necessidade de acomodar despesas obrigatórias que antes seriam reduzidas pela MP.
O texto geraria uma economia de cerca de R$ 15 bilhões no ano que vem, dos quais R$ 11 bilhões com a inclusão do Pé-de-Meia no piso da educação. O restante viria das mudanças no seguro-defeso (pago a pescadores artesanais no período em que a atividade é proibida), no Atestmed (sistema online para concessão de auxílio-doença sem perícia presencial) e na compensação previdenciária a estados e municípios.
O Pé-de-Meia, que paga bolsas de incentivo a alunos do ensino médio, é classificado como despesa discricionária, então o ajuste não vai alterar a proporção desse tipo de gasto no Orçamento, embora implique redução de outras ações da área de educação. Como a proposta foi enviada com um excesso de R$ 3 bilhões em relação ao piso da educação, a necessidade de ajuste será da ordem de R$ 8 bilhões.
Os outros R$ 7 bilhões são despesas obrigatórias, ou seja, a necessidade de reacomodá-los vai reduzir a proporção das discricionárias no Orçamento. Na soma de todos os fatores, o espaço para gastos mais flexíveis pode encolher até R$ 28 bilhões sem a MP.
Técnicos do governo afirmam que, ao mediar o acordo, o ministro do STF Flávio Dino ressaltou que a expansão das emendas não pode se dar às custas das demais despesas discricionárias do Executivo. À luz desse entendimento, os R$ 7,1 bilhões seriam o corte necessário para manter a participação das demais obrigatórias no Orçamento.
Há uma interpretação alternativa, ventilada no Congresso, de que o risco de achatamento das discricionárias impediria apenas o crescimento real das emendas, mas não autorizaria redução nominal dessas verbas de um ano para outro. Nesse cenário, o corte seria de R$ 2 bilhões, mas o governo rechaça esse entendimento.
A avaliação entre os técnicos é que o ajuste deve se dar principalmente sobre as emendas de comissão, já que as demais são impositivas, isto é, obrigatórias. Na prática, em vez de distribuir R$ 12 bilhões às comissões, os parlamentares só terão R$ 5 bilhões nessa modalidade.
As emendas que ficarem de fora do Orçamento até podem ser retomadas, mas o caminho é mais burocrático. Além da comprovação de melhora da situação fiscal, com aumento de receitas e redução de gastos obrigatórios, o Executivo precisará enviar um projeto para abrir crédito no Orçamento, o que dependerá de aprovação em sessão conjunta do Congresso. Só depois disso será possível executar as ações.
Em um ano eleitoral, durante o qual há uma série de restrições à aplicação de verbas públicas, essa demora pode atrapalhar os planos de parlamentares que pretendem irrigar seus redutos eleitorais com emendas.
Nos últimos dias, líderes e deputados governistas no Congresso afirmam que o governo estuda um arsenal de medidas para recuperar a arrecadação prevista com a MP dos impostos. A tentativa é costurar a aprovação de um texto que reúna trechos que já haviam sido alvo de acordo entre as bancadas.
Estão nas negociações a regra que limita o uso de créditos tributários para abater impostos a pagar, permitindo o benefício apenas quando houver comprovação de efetivo pagamento do tributo que gerou o crédito, ou ainda a tributação maior das bets.
Na semana passada, Lula citou a possibilidade de retomar o aumento da tributação sobre as fintechs citadas por Lula. Há ainda governistas que defendem o um novo decreto para ampliar o IOF (Imposto sobre Operações Financeiras), já que o recuo parcial na ampliação anunciada em maio foi o que deu origem à edição da MP dos impostos.